'A taça do mundo é nossa': Copa é tema de pesquisas desenvolvidas na UFMG

Maior competição do futebol inspira estudos em diversos campos do conhecimento

Nos campos de futebol do Catar, seleções de 32 países disputam o título de campeão da Copa do Mundo de futebol masculino em 2022. Nos campos do conhecimento científico, pesquisadores e pesquisadoras investigam os fenômenos relacionados à disputa tanto em relação aos aspectos técnicos que se configuram nas chamadas quatro linhas quanto ao impacto afetivo e social da competição na vida das pessoas, sob os mais diversos olhares. 

De acordo com o professor Gibson Moreira, do Departamento de Esportes da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional (EEFFTO) da UFMG, “a Copa do Mundo é um dos maiores eventos esportivos do mundo e é importante porque congrega países de todos os continentes em torno do futebol. Do ponto de vista científico, é um evento único, porque possibilita estudos sobre as mais variadas realidades, da perspectiva esportiva e, também, de outras ciências”. 

A grandiosidade da World Cup Qatar 2022, destacada por Moreira, pode ser percebida em alguns números oficiais do evento: 832 jogadores convocados, 64 jogos em 29 dias, 3 milhões de ingressos disponíveis e distribuição de mais de 2 bilhões de dólares em prêmios. 

A variedade de possibilidades de estudos científicos é evidenciada por algumas das principais pesquisas desenvolvidas na UFMG sobre a Copa. Nesta reportagem especial da TV UFMG, cinco grupos dos campos da Educação Física, Psicologia, Matemática, Comunicação Social e do Direito compartilharam perspectivas de investigação, também com ênfase crítica às denúncias de desrespeito aos direitos humanos no Catar, país que sedia a disputa.

Escalação

Representando diversos estudos conduzidos na UFMG sobre futebol e sobre a Copa do mundo, cinco integrantes de grupos de pesquisa foram convocados para compartilhar reflexões sobre a Copa. Em uma escalação simbólica, entraram em campo nesta reportagem: Gibson Moreira, do Departamento de Esportes e integrante do UFMG Soccer Science Center (perspectiva esportiva), a doutoranda em Psicologia da UFMG Bárbara Mendes, participante do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT – UFMG (psicologia), o professor Andityas Matos, da Faculdade de Direito e coordenador do grupo O Estado de Exceção no Brasil Contemporâneo (normas e filosofia), a professora Ana Carolina Vimieiro, do Departamento de Comunicação Social e coordenadora do Coletivo Marta (presença das mulheres na cobertura jornalística) e o professor Gilcione Nonato Costa, do Departamento de Matemática e coordenador do grupo Probabilidades no Futebol (ciências exatas). 

Jogadas e táticas

Criado em 2014, o grupo de pesquisa UFMG Soccer Science Center, da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, investiga o futebol de maneira holística, apesar do foco nos aspectos físicos e esportivos. Neste ano, o professor e integrante do grupo Gibson Moreira lidera um estudo sobre as jogadas, os erros e acertos dos jogadores que disputaram copas passadas. “De forma geral, a educação física estuda a Copa para avaliar treinamento tático, análise de desempenho, prevenção de lesões e treinamento físico”, explica Moreira.

Torcida e violências

Institucionalizado em 2007, o Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da UFMG se detém sobre questões relacionadas às identidades de gênero e orientações sexuais. Integrante do grupo, a doutoranda em Psicologia Bárbara Menezes estuda as torcidas e as violências imbricadas no contexto do futebol, entendido por ela como um espaço fortemente racista, machista e LGBT+fóbico, o que não difere da realidade da sociedade. Em abordagem mais ampla, Bárbara avalia que a Psicologia pode estudar o futebol e a Copa do mundo “focando em diferentes prismas, como a interação entre os jogadores e a comissão técnica, o modo como o ato de torcer impacta o ambiente social, os efeitos sociais, políticos e afetivos que a realização do evento pode produzir em uma sociedade”.

Abuso, corrupção e 'maquiagem social'

Para o coordenador do grupo de pesquisa O Estado de Exceção no Brasil Contemporâneo, da Faculdade de Direito da UFMG, Andityas Matos, é preciso avaliar a Copa do Mundo de maneira crítica, uma vez que o clima de festa dominante tende a mascarar os problemas. O pesquisador avalia as intervenções realizadas pela Federação Internacional de Futebol (Fifa) como abusivas e corruptivas, em especial devido à exploração dos países que sediam o evento e à “maquiagem social” promovida nas cidades em que se encontram os estádios – quando, por exemplo, pessoas em situação de rua são recolhidas e levadas para lugares distantes do evento. O FifaGate, operação iniciada em 2015, é um dos mais emblemáticos casos de corrupção no futebol.

Além do viés da filosofia do direito, ao qual se filia o grupo coordenado por Matos, o campo do Direito realiza estudos sob outras perspectivas, explica o professor: “uma dimensão clássica é o direito desportivo, que pensa nas normas que regulam as relações no futebol. Há também a perspectiva do direito internacional, que avalia a ida de pessoas do mundo todo a um local com leis próprias e normatividades”. 

Mulheres em campo

Tradicionalmente, a área da Comunicação Social estudava a Copa do Mundo e, em especial, o futebol brasileiro como traço definidor da identidade nacional, mas, nos últimos anos, outras formas de estudar os dois fenômenos têm ganhado força. É o que explica Ana Vimieiro, coordenadora do Coletivo Marta da UFMG, criado em 2018. “Há certa mudança de foco, e os olhares começam a ser direcionados a coisas mais cotidianas, como os campeonatos nacionais, as relações com os clubes, as identidades locais e os times. São mudanças de perspectivas sob as quais se investiga, inclusive, a Copa do Mundo Feminina [que será realizada em 2023, na Nova Zelândia e Austrália].”

Neste ano, os estudos liderados por Ana Vimieiro têm foco nas mulheres brasileiras participantes das coberturas midiáticas da Copa do Mundo de futebol masculino. Um questionário será aplicado e respondido por algumas das principais profissionais atuantes na cobertura da edição de 2022. O objetivo é avaliar como se dá a participação delas e os dilemas que vivenciam.

A bola e suas probabilidades

Iniciado em 2005, o grupo de pesquisa Probabilidades no Futebol, coordenado pelo professor Gilcione Nonato Costa, estuda, de acordo com ranqueamentos das classificações de times e seleções, os enfrentamentos e vitórias mais prováveis entre as equipes que disputam determinado título. Neste ano, as atenções estão voltadas para a Copa do Mundo. De acordo com Costa, com base nos dados disponíveis, que medem o poderio de cada equipe, as seleções da França e do Brasil são as mais cotadas para vencer a disputa.

Além dos estudos como os realizados pelo grupo Probabilidades, a matemática, de forma mais ampla, se apropria cientificamente da Copa fazendo projeções, estabelecendo as possibilidades de confrontos e de um time chegar a uma fase seguinte. "Tudo isso é feito com base na avaliação da força de um time, com base nas vitórias que ele alcançou", explica Gilcione Costa.

'Mito salvacionista'

“O Catar é uma monarquia absoluta, na forma de emirado, dominado por uma única família e despreocupado com direitos humanos, democracia e grupos socialmente excluídos”, afirma Andityas Matos. Nas redes sociais, diversas denúncias contra os desrespeitos aos direitos humanos, em especial, à comunidade LGBT+, têm sido compartilhadas. 

Apesar da necessidade de atenção a tais pontos, a doutoranda em Psicologia na UFMG Bárbara Menezes alerta para o que chama de certo “mito salvacionista”, traduzido no fato de que culturas ocidentais se sentem superiores às orientais, como a do Catar. “Temos que pensar nas razões que levam ao questionamento de alguns países e não de outros. O contexto brasileiro também é marcado por profundo desrespeito aos direitos humanos", contrapõe a pesquisadora.

Para o educador físico e pesquisador da EEFFTO Gibson Moreira, a ciência e a sociedade em geral têm, por meio de um evento de grande magnitude, como a Copa do Mundo, a oportunidade de refletir sobre os diversos problemas culturais e sociais que atravessam a disputa.

Outros times

As cinco perspectivas apresentadas nesta reportagem não esgotam as possibilidades de investigação científica da Copa do Mundo, tampouco representam todos os estudos sobre o tema conduzidos na UFMG. É possível conhecer outras frentes de pesquisa por meio da plataforma Somos UFMG e do Banco de Teses e Dissertações.

Equipe de reportagem: Pedro Campos (motorista), Laura Bragança (apuração e produção de externa), Olívia Resende (produção de externa), Pablo Paixão (produção de externa), Ângelo Araújo (imagens), Samuel do Vale (imagens), Marcelo Duarte (edição de imagens) e Ruleandson do Carmo (produção, reportagem e edição de conteúdo)

Apoio: Thiago Nogueira (assessoria de imprensa do Mineirão), Iago Proença, Fabiano Guieiro, Melissa Souza (equipe da assessoria de imprensa da EEFFTO) e Marcelo Lima (diretoria de esporte e lazer da Assufemg, que deu apoio operacional)

Texto de Ruleandson do Carmo

Fonte

Assessoria de Imprensa UFMG