Emérito da UFMG, Jacyntho Brandão lança livro de contos centrado na erótica da errância
Mesclando sensualidade e humor, obra de professor trabalha a forma como celebração da alta literatura
O professor emérito da Faculdade de Letras (Fale) da UFMG Jacyntho Lins Brandão lançou, na última semana, o livro de contos Ode à errância (Editora Patuá). A obra reúne quatorze contos organizados em torno de um mote comum: a relação entre os erros, a errância, e Eros, a erótica. A rigor, o díptico estabelecido por essas duas ideias é mais que mote: a relação entre o erro e o prazer se realiza como um método de escrita digressiva. Trata-se, ao cabo, do modo próprio de narrar e ficcionalizar encontrado pelo autor para produzir uma obra efetivamente singular, condizente com a sua estatura intelectual, em um período mais consolidado de sua carreira.
No primeiro conto, denominado justamente Dos contos (que também funciona como uma introdução ao volume), o narrador explica e mitifica três aspectos: a sua razão para escrever contos (a insônia), o método de sua escrita (a errância prazerosa) e o tipo de conto de sua predileção (os longos, posto que capazes de cobrir uma insônia inteira – seja de quem escreve, seja de quem lê). Algumas das histórias do livro vão, de fato, cobrir, sozinhas, algumas dezenas de páginas – é o caso de Meia e dúzia, Potranca trácia e [Fedra], com mais de 40 páginas cada.
Em Meia e dúzia, conto de estilo e mote machadianos, um idoso de memória inconfiável repassa a sua vida como estratégia para tentar entender o presente, e uma tal Iphigênia povoa suas lembranças à moda de uma Capitu revolucionária – a Capitu mal lembrada por Bentinho, entre as brumas confusas de sua ora traiçoeira, ora interessada memória. Aqui, sob o falso tema da importância que o corpo vai ganhando para o homem quanto mais se vai avançando na idade, tem-se um conto que se escreve à moda dos desdobramentos sem-fim, em que assuntos se filiam indefinidamente em assuntos, ao mesmo tempo em que ideias fixas são retomadas e postas a circular.
Em maior e menor grau, o tom e o mote machadianos vão aparecer em várias outras histórias, como as citadas Potranca trácia (que lembra Brás Cubas e suas memórias) e [Fedra] (história que, em diálogo regular com o leitor, se organiza pelas idas e vindas do abecedário).
Parceria com as independentes
Ode à errância é o segundo livro que Jacyntho lança pela casa editorial comandada por Eduardo Lacerda; em 2023, a editora tirara do prelo Harsíese, obra que acabaria vencendo o Prêmio Literário Biblioteca Nacional daquele ano, na categoria poesia. Na obra, Jacyntho reúne o melhor de sua produção poética recente – que, assim como o livro de agora, converge para o mote da memória e da necessidade de se dar vazão a ela. Tanto Ode à errância quanto Harsíese demarcam um movimento mais recente do escritor na direção de dar mais vazão à publicação da sua obra ficcional, na esteira de seu longo histórico de publicações focadas nos estudos literários e nas traduções de textos clássicos. Helenista consagrado, Jacyntho é autor de diversos ensaios teóricos sobre a literatura, como Antiga musa: Arqueologia da ficção (Relicário, 2015), e de várias traduções feitas de clássicos das línguas mais antigas, como o acádio.
Ficha técnica
Livro: Ode à errância
Autor: Jacyntho Lins Brandão
Editora: Patuá
R$ 60 / 268 páginas
(Com base em texto de Ewerton Martins Ribeiro para o Portal UFMG)