Estudo da UFMG estima que, até 2030, três em cada dez adultos podem se tornar obesos no Brasil
Até 2030, três em cada dez adultos podem se tornar obesos no Brasil. A previsão faz parte do artigo Time trends and projected obesity epidemic in Brazilian adults between 2006 and 2030, publicado em julho na Scientific Reports. Pesquisadores da UFMG e de outras instituições brasileiras e internacionais desenvolveram o material utilizando dados da pesquisa Vigitel, coletados por entrevista telefônica entre 2006 e 2019 com 730.309 participantes. O estudo revelou que a prevalência de obesidade aumentou de 11,8% em 2006 para 20,3% em 2019.
Segundo a pesquisa, a previsão é que até o final da década, 68,1% da população brasileira esteja com sobrepeso, 29,6% com obesidade e 9,3% com obesidade classes II e III. Segundo o professor do Departamento de Nutrição da Escola de Enfermagem da UFMG, Rafael Moreira Claro, mulheres, negros e outras etnias minoritárias, adultos de meia-idade, adultos com menos de 7 anos de escolaridade, residentes das capitais do Norte e Centro-Oeste, têm ainda mais chance de serem diagnosticados com obesidade até 2030. “Nossos achados indicam um aumento sustentado da epidemia de obesidade em todos os subgrupos sociodemográficos e em todo o país”.
A situação é ainda mais complicada para o sexo feminino, a prevalência de obesidade é estimada em 30,2% nas mulheres e 28,8% nos homens. Em todo Brasil, a expectativa é que um quarto da população adulta pode estar vivendo com obesidade em 24 das 27 unidades geográficas do país. A tendência é que a prevalência de obesidade classes II e III seja superior a 10% em 8 das 27 unidades. Entre as capitais com maior estimativa de prevalência de obesidade até 2030, Manaus lidera o ranking com 35,8%, seguida por Cuiabá com 34,9% e Rio Branco com 32,8%. Já as que figuram com menor porcentagem são Florianópolis (23,0%), Palmas (23,8%) e Curitiba (24,9%). Em Belo Horizonte, a previsão é que 28,67% da população seja diagnosticada com a doença.
Histórico da obesidade
O professor explica que a epidemia de obesidade é uma preocupação global de saúde pública. Em 2016, aproximadamente 1,9 bilhão de adultos viviam com obesidade, e uma tendência crescente de tempo tem sido observada em quase todos os países do mundo. “Estudos sobre as trajetórias futuras projetadas da prevalência da obesidade são escassos em países de baixa e média renda, apesar de seu potencial para informar a necessidade de estratégias preventivas e preparação dos sistemas de saúde para lidar com as consequências da obesidade”.
Ele destaca que o World Obesity Atlas 2022 estimou recentemente que uma em cada cinco mulheres e um em cada sete homens viverão com obesidade até 2030. A prevalência global projetada para 2030 é estimada em 17,5% (aproximadamente, 1 bilhão de pessoas) para obesidade e 5,7% (333 milhões de pessoas) para obesidade classes II e III.
Em 2006, as prevalências de sobrepeso, obesidade e obesidade classes II e III em adultos brasileiros foram de 30,9%, 8,6% e 3,2%, respectivamente. Em 2019, as prevalências chegaram a 35,1% para sobrepeso, 14,6% para obesidade e 5,7% para obesidade classes II e III.
Ainda de acordo com o estudo, entre 2006 e 2019, houve um aumento de 30% na prevalência de excesso de peso (de 42,6% em 2006 para 55,4% em 2019), um aumento de 72% na prevalência de obesidade (de 11,8 para 20,3%) e um aumento de 76% na prevalência de obesidade classes II e III (de 3,2 para 5,7%).
Importância do estudo
Rafael Claro explica que a obesidade é um importante fator de risco para diversas Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), como doenças cardiovasculares, diabetes e diversos tipos de câncer. “Em 2019, as DCNT foram responsáveis por 55% das 738.371 mortes no Brasil, das quais 56,1% ou 173.207 ocorreram em adultos de 30 a 69 anos e, portanto, são prematuras e evitáveis (em princípio). A crescente epidemia de obesidade tem contribuído para o aumento da carga de câncer no Brasil. Aproximadamente 15 mil casos de câncer por ano são atribuíveis ao IMC elevado no Brasil, e as projeções sugerem que esse número poderá ultrapassar 29 mil casos até 2025”, ressalta.
O professor enfatiza, ainda, que o estudo tem importantes implicações para a saúde pública, e conta que a epidemia de obesidade projetada no Brasil reforça que a prevenção primária é fundamental para mudar as trajetórias da obesidade no país. “Nossos achados também destacam a importância de estratégias de prevenção da obesidade com foco em toda a população, sistemas de vigilância e pesquisas de prevenção para melhor avaliar e desenhar estratégias de saúde pública. Além disso, nossos resultados mostraram que a obesidade afeta grupos mais desfavorecidos socioeconomicamente, que tendem a ter menos acesso à saúde e piores desfechos de saúde. Portanto, políticas de saúde pública mais bem direcionadas à prevenção da obesidade e redução das desigualdades sociais podem reduzir a carga de doenças para as gerações futuras, mudar a tendência prevista e proteger indivíduos vulneráveis”.
Segundo o pesquisador, as previsões do estudo pressupõem que não ocorrerão grandes mudanças nos determinantes da obesidade nos próximos anos. No entanto, desde o início da pandemia da covid-19 em 2020, o mundo vem enfrentando uma crise sanitária, econômica e social sem precedentes, que afeta desproporcionalmente indivíduos pobres e países de baixa e média renda. O desemprego e a inflação aumentaram no Brasil e as medidas de austeridade comprometeram o financiamento da proteção social, comprometendo a segurança alimentar e nutricional de grupos vulneráveis. “Assim, projetamos que o empobrecimento da população, aliado ao limitado acesso econômico a alimentação saudável e atividade física, possa levar a um aumento mais acentuado das taxas de obesidade em um futuro próximo”, explica Rafael.
Além do professor Rafael Claro, o estudo tem autoria de José Matheus Estivaleti e Leandro FM Rezende, da Universidade Federal de São Paulo, Juan Guzmán-Habinger e Javiera Lobos, da Universidad Mayor no Chile, Catarina Machado Azeredo, da Universidade Federal de Uberlândia e Fernando Adami, do Centro Universitário FMABC.
Vigitel
O Vigitel é uma pesquisa telefônica anual realizada entre 2006 e 2019 para monitorar indicadores de saúde em adultos com idade superior a 18 anos de 26 capitais estaduais e do Distrito Federal. As perguntas do questionário do Vigitel 2021 incluíram características sociodemográficas dos indivíduos e também características do padrão de alimentação e de atividade física associadas à ocorrência de Doenças Crônicas Não Transmissíveis, por exemplo: frequência do consumo de frutas e hortaliças e de refrigerantes; e frequência e duração da prática de exercícios físicos e do hábito de assistir televisão, peso e altura referidos.