Golpe de 1964 e a luta pela democracia são temas de exposição da UFMG
Além de cinco salas para visitação, poderão ser conhecidas obras inéditas de oito artistas convidados especialmente para a mostra
Aberta à visitação pública até 31 de julho, no Centro Cultural UFMG, a exposição Desconstrução do Esquecimento: Golpe, Anistia e Justiça de Transição revisita momentos da história do país. A mostra, que faz parte das comemorações dos 90 anos da UFMG, foi concebida no âmbito do projeto Memorial da Anistia do Brasil.
Estruturada em três eixos – golpe, anistia e justiça de transição –, ela foi montada em cinco salas da galeria Aretuza Moura, do Centro Cultural UFMG, e reúne obras inéditas de oito artistas.
Com curadoria do professor e escultor Fabrício Fernandino, a exposição tem subtemas como estruturas de repressão, desrespeito aos direitos indígenas, articulação das mulheres na luta pela anistia e políticas de reparação. O público poderá ter contato com um material rico em textos, fotos, vídeos, áudios e objetos, além de livros, documentos e jornais da época, fruto de um trabalho de pesquisa que envolveu profissionais de diferentes áreas da universidade. O visitante será também convidado a percorrer uma linha do tempo em que momentos importantes da luta pela democracia dialogam com manifestações e expressões artístico-culturais da época.
A base conceitual da exposição – que norteou os núcleos de Expografia, Design Gráfico e Design de Luz – foi forjada buscando relacionar elementos que remetem ao passado / presente / repressão/ resistência / avanço. O objetivo é possibilitar uma leitura contemporânea, ao mesmo tempo em que remete a um passado que se repete. São usados andaimes e escoras de estruturas em construção que se inserem conceitualmente como algo que opera na transição, que está sendo construído, em consolidação e faz referência a atual situação do Memorial da Anistia Política do Brasil.
O material pesquisado para a exposição Desconstrução do Esquecimento: Golpe, Anistia e Justiça de Transição é fruto de parceria com o Projeto República: núcleo de pesquisa, documentação e memória, vinculado à Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, e o Centro de Estudos sobre Justiça de Transição, da Faculdade de Direito, ambos da UFMG, baseado no mapa curatorial da exposição de longa duração do Memorial da Anistia Política do Brasil.
Obras inéditas
Oito artistas convidados de diferentes áreas das artes criaram obras inéditas para a mostra, que integrarão o acervo do Memorial da Anistia Política do Brasil e serão apresentadas com exclusividade na mostra Sentimentos, na sala Celso Renato, no segundo pavimento do Centro Cultural UFMG.
Os artistas são: Clébio Maduro, Eder Santos, Eustáquio Neves, Jorge dos Anjos, Marco Túlio Resende, Mário Zavagli, Maurício Gino e Shirley Paes Leme. Produzida pelo curador da exposição, professor Fabrício Fernandino, a escultura Projeções da memória homenageia os quatro estudantes da UFMG mortos pela ditadura militar (Gildo Macedo Lacerda, Idalísio Soares Aranha Filho, José Carlos Novaes Mata Machado e Walquíria Afonso Costa) e poderá ser vista no pátio interno do Centro Cultural.
Salas Expositivas
Sala 1: Golpe
A mudança da capital federal para o Planalto Central, em 1960, inaugura uma década marcada por agudas contradições e transformações, tanto políticas quanto comportamentais, sociais e artísticas. Após a renúncia do presidente Jânio Quadros, em 1961, o seu vice, João Goulart, assume a presidência e, visto por militares e setores conservadores como demasiado afeito a ideias de esquerda, sofre o golpe em 31 de março de 1964. Contando com um apoio popular que já se tornava aparente, com marchas “com Deus e pela família” por todo o País, o golpe civil-militar mergulharia o Brasil em um regime ditatorial por 21 anos, com uma sequência de militares no poder que só seria interrompida em 1984, com a eleição indireta de Tancredo Neves.
Nesta sala: Ruptura por armas / Ruptura silenciosa / Aparato legal de legitimação do golpe / Estrutura da Repressão
Salas 2 e 3: Repressão e Resistência
Entre 1964 e 1985, repressão e resistência eram palavras comuns no discurso político brasileiro. De um lado, o aparato de repressão montado para garantir a continuidade da ditadura; de outro, um conjunto de pessoas imbuído do propósito de derrubar ou derrotar a ditadura.
Nestas salas: Resistência subterrânea / Resistência na UFMG / Sociedade civil e resistência / Mulheres e participação política / Genocídio indígena / A questão da terra / Repressão policial
Sala 4: Anistia
A dimensão política da anistia no Brasil é rica e complexa. Por um lado, significou a luta pela descriminalização da oposição política à ditadura. Por outro lado, significou a luta contra a tentativa do regime autoritário de restringir seu alcance, de modo a não abarcar o que a ditadura chamava de “crimes de sangue” – crimes mais graves praticados pelos resistentes (que a lei viria a especificar como crimes de assalto, sequestro, terrorismo e atentado pessoal). No intuito de fazer um contraponto à ideia de anistia proposta pelos governistas, os Comitês Brasileiros pela Anistia criaram a demanda por uma “anistia ampla, geral e irrestrita”, ou seja, uma noção que contemplasse quaisquer atos de resistência, armada ou não, praticados por aqueles que se opunham à ditadura.
Como lidar com os crimes contra a humanidade, como torturas, desaparecimentos forçados e execuções sumárias, praticados por agentes da repressão? Esse foi um grave problema surgido a partir da Lei de Anistia. O discurso de uma anistia ampla, geral e irrestrita começou a ser invocado como se ele também abarcasse uma autoanistia dos crimes do regime. A anistia reivindicada pelos movimentos sociais não havia sido alcançada. Assim, a bandeira seguiu presente, a fim de romper com as dificuldades criadas pela própria lei, sobretudo no que tange à impunidade criada para os crimes praticados por agentes do governo.
Nesta sala: Movimentos sociais na luta pela anistia / Movimento Feminino pela Anistia / Comitês pela Anistia / Presos políticos na luta pela anistia / O discurso do regime; Processo legislativo da anistia / Aplicação e ampliação da Lei de Anistia / Atentados contra a abertura democrática / Diretas Já / A anistia na Constituição de 1988
Sala 5: Justiça de Transição
A justiça de transição envolve um conjunto de medidas que permitem a superação de um regime autoritário para a construção de uma ordem democrática e que garanta os direitos humanos. A ONU, em seu Relatório S/2004/16 do Conselho de Segurança, define a justiça de transição como o conjunto de medidas e mecanismos desenvolvidos por uma sociedade na tentativa de lidar com um legado de abusos em larga escala no passado.
Nesta sala: Assembleia Nacional Constituinte / Projeto Brasil Nunca Mais / Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos / Comissão Nacional da Verdade / Comissão de Anistia e Políticas de Reparação / Caravanas da Anistia / Clínicas do Testemunho / A Corte Interamericana de Direitos Humanos e o caso Gomes Lund / O STF e o julgamento da autoanistia / Responsabilização / Ações civis de familiares / Rede Latino-Americana de Justiça de Transição / Reformas institucionais
Sala Ana Horta:
Projeto Memorial da Anistia Política do Brasil
Fruto de um trabalho conjunto da Comissão de Anistia (Comissão de Anistia do Ministério da Justiça – CA/MJ) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o Memorial consistirá em um importante centro de pesquisa e documentação. O objetivo é aliar as dimensões da reparação individual e coletiva, por meio da preservação da memória do período que vai de 1964 até o início da redemocratização brasileira e, a partir dos registros, aprofundar o conhecimento sobre o passado recente no país, que por muito tempo foi silenciado.
Ensaio fotográfico Memória em Processo: fragmentos
Paulo Baptista
Sala Celso Renato e hall superior: Sentimentos
Obras inéditas dos artistas convidados: Clébio Maduro / Eder Santos / Eustáquio Neves / Jorge dos Anjos / Marco Túlio Resende / Mário Zavagli / Maurício Gino / Shirley Paes Leme
Pátio interno: Projeções da Memória
Esculturas de Fabrício Fernandino. Homenagem aos quatro estudantes da UFMG mortos durante a ditadura militar: Gildo Macedo Lacerda, Idalísio Soares Aranha Filho, José Carlos Novaes da Mata Machado e Walquíria Afonso Costa.