Livro de preofessor da UFMG refuta tese de que o eixo Rio-São Paulo foi a única porta de entrada para a prática esportiva no país

A obra tem foco na região Centro-oeste

Sempre prevaleceu, na história da prática esportiva no Brasil, a tese de que o Rio de Janeiro e São Paulo eram o elo entre Europa e os estados mais interiorizados no que diz respeito à sua difusão. Essa premissa, no entanto, é posta em xeque no livro Esportes nos confins da civilização: Goiás e Mato Grosso, c. 1866-1936, de autoria do professor Cleber Dias, do Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Estudos do Lazer, da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional (EEFFTO) da UFMG.

Segundo o autor, a motivação para a obra nasceu da constatação de que não havia, na literatura, trabalhos sobre a história do esporte em Goiás e no Mato Grosso. “Em princípio, seguindo o modelo teórico já estabelecido, que prescrevia o eixo Rio-São Paulo como vértice inevitável do processo de desenvolvimento histórico dos esportes no Brasil, eu procurava elementos que confirmassem essas suposições. Essa busca, no entanto, foi inteiramente frustrada”, relata.

Cleber Dias afirma que foi “empurrado” para um esforço de construção de explicações alternativas. “Não demorei muito para perceber que a realidade histórica dos esportes no Centro-oeste brasileiro era bastante diferente do que relatavam os livros e textos sobre o assunto, sempre elaborados sob a perspectiva das grandes cidades”, explica o professor, que esteve envolvido na pesquisa de 2011 a 2017.

Um exaustivo trabalho de investigação, de acordo com o autor, foi realizado em 11 arquivos e bibliotecas de Goiás, Mato Grosso, Rio de Janeiro e Minas Gerais, reunindo documentos ou fragmentos de documentos sobre o assunto. “Consultei também trabalhos e fontes documentais que não tratavam diretamente dos esportes, tentando ampliar minha compreensão da dinâmica histórica mais geral dessas regiões, a fim de estabelecer correlações”, relata.

Isolamento

De acordo com o autor, uma das conclusões mais surpreendentes de sua pesquisa foi a de que, provavelmente, o interesse e a prática de esportes floresceram simultaneamente nas áreas urbanas e rurais do país. “Em regiões mais afastadas, o esporte se desenvolveu de modo relativamente precoce, desde princípios do século 20. A história do esporte nessas regiões questiona noções de isolamento que tão frequentemente as marcam”, reflete.

O desenvolvimento de práticas esportivas nesses lugares, como afirma Cleber Dias, não foi, portanto, um mero reflexo do que acontecia em grandes cidades do país. “Agentes dessas regiões tinham suas próprias motivações, muitas vezes radicadas em interesses econômicos ou políticos regionais”, observa.

O autor enfatiza que as relações entre o desenvolvimento rural e o florescimento histórico das modalidades contrariam estereótipos consolidados sobre os territórios rurais do país em geral, e não apenas a respeito da região Centro-oeste. “O trabalho agrícola, historicamente associado ao atraso, pôde também ser instrumento de estímulo à adoção de hábitos modernos, como a prática de esportes”, argumenta.

Trabalho extensivo e paciente

O professor chama a atenção para um importante aspecto inerente ao processo relacionado a pesquisas desse tipo, que classifica como “longo e demorado”. Segundo ele, algumas pesquisas, pela sua própria natureza, exigem um trabalho mais extensivo e paciente, necessitando, por isso, de mais tempo do que aquele normalmente disponível para pesquisadores de pós-graduação, por exemplo. “Prazos excessivamente curtos e inflexíveis, muitas vezes, inviabilizam empreendimentos desse tipo, o que representa um estreitamento do nosso horizonte intelectual e acadêmico. Em razão dos prazos draconianos a que estão submetidos, estudantes de mestrado ou de doutorado dificilmente poderiam realizar pesquisas como a que gerou esse livro”, avalia.

Matheus Espíndola - Boletim UFMG 2.028

Fonte

Assessoria de Imprensa da UFMG