Pesquisadores da UFMG sugerem nova hipótese para origem de trechos móveis de DNA
Artigo contém achados sobre elementos genéticos pouco conhecidos, mas muito importante para evolução de genomas e espécies
Pesquisadores do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG encontraram evidências de que o helitron, elemento genético móvel pouco conhecido, mas muito importante para a evolução de genomas e espécies, pode ter origem nas bactérias, embora esteja presente hoje apenas em animais, plantas, fungos e protozoários. A hipótese está explicada em artigo recém-publicado na revista Molecular Biology and Evolution pelos professores Gustavo Kuhn e Pedro Heringer, do Departamento de Genética, Ecologia e Evolução. O periódico é vinculado à Society for Molecular Biology and Evolution.
Segundo Gustavo Kuhn, mais de 50% do DNA de muitas espécies de animais e vegetais é constituído por trechos repetidos, que incluem os transposons. Esses elementos são sequências de DNA que se movem de uma parte do genoma para outra, usando como veículo as proteínas denominadas transposases, e têm a capacidade de se proliferar por conta própria.
A movimentação desses elementos genéticos de um cromossomo para outro pode ter, dependendo da região de saída ou de entrada, efeitos no funcionamento da célula como, em alguns casos, mutações indesejadas. A maior parte dos transposons encontrados nos genomas dos seres vivos não gera qualquer efeito nocivo para as células, e eles são, muitas vezes, fonte de variabilidade genética que pode contribuir positivamente na adaptação das espécies.
Pedro Heringer explica que foram estudados especificamente os transposons chamados de helitrons, que tiveram papel importante na evolução das espécies, por exemplo, aumentando o tamanho dos seus genomas, causando duplicações gênicas e modulando a atividade de genes. Os helitrons estão, portanto, relacionados à evolução adaptativa dos seres vivos. Sabe-se também que eles constituem aproximadamente até 7% do DNA genômico em plantas e até 10% em animais.
O estudo da UFMG encontrou evidências de que, provavelmente, os helitrons habitavam células bacterianas e existiam como plasmídeos (moléculas de DNA circular capazes de se replicar de forma independente). Heringer e Kuhn investigaram como propriedades funcionais da transposase, a proteína que funciona como espécie de veículo dos helitrons, possibilitaram a posterior invasão desses elementos em eucariotos, grupo que inclui animais, plantas, fungos e protozoários. Ou seja, apesar de atualmente serem encontrados exclusivamente em eucariotos, os helitrons provavelmente representam DNAs móveis que originalmente habitavam células bacterianas.
Análises de bioinformática
Por meio de análises de bioinformática, os pesquisadores do ICB estudaram o genoma de centenas de organismos e vírus que possuem um gene similar à transposase, presente nos helitrons. Eles compararam os resultados obtidos com outras informações recém-publicadas e, a partir dessas evidências, perceberam que a origem dos helitrons é bem mais antiga do que se pensava. “É anterior mesmo à própria origem dos animais, plantas, fungos e protozoários”, explica Heringer.
O pesquisador esclarece que diferentes hipóteses foram sugeridas anteriormente para explicar a origem dos helitrons, mas nenhuma delas considerava que esses elementos poderiam ser descendentes de plasmídeos bacterianos, como revelado no estudo feito a UFMG. Como a transposase dos helitrons utiliza um mecanismo único para movimentar sequências de DNA, uma melhor compreensão desses elementos pode contribuir para o desenvolvimento de novas tecnologias de engenharia genética.
A expectativa é de que, no futuro, a transposase dos helitrons possa ser adaptada para integrar sequências de DNA específicas nos genomas de organismos de forma controlada, talvez até com eficiência superior à de algumas ferramentas utilizadas atualmente para esse fim. Um segundo trabalho está sendo concluído, no momento, em tentativa de explicar como os helitrons são capazes de colonizar novos organismos e se estabelecer em seus genomas. “Apesar de quase sempre se replicarem e de se movimentarem apenas dentro das células de um mesmo hospedeiro, em ocasiões raras os transposons conseguem invadir novas espécies, como fazem alguns vírus de animais que passam a infectar humanos”, conclui Pedro Heringer.
Artigo: Pif1 helicases and the evidence for a prokaryotic origin of helitrons
Autores: Pedro Heringer, Gustavo CS Kuhn (ICB-UFMG)
Publicação: Molecular Biology and Evolution, Volume 39, Edição 1, janeiro de 2022