Pesquisadores da UFMG usam imagens feitas por não cientistas para investigar comportamento da aves
Pesquisadores investigaram capacidade dos animais de usar as patas; artigo está publicado na Nature
Imagens feitas por não cientistas, em várias partes do mundo, são usadas para estabelecer possíveis relações entre grupos de pássaros e seu desenvolvimento evolutivo. O movimento caracterizado pela parceria entre cientistas e não cientistas é a chamada "ciência cidadã".
A pesquisadora Clara Amaral, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG, analisou informações que foram obtidas em sites que publicam imagens registradas por pessoas não especializadas na área científica. Isso ajudou a esclarecer a capacidade de preensão das aves, ou seja, sua habilidade de manipular objetos com suas patas e cumprir funções como se alimentar, transportar e até mesmo brincar com objetos. Algumas aves têm muito movimento nas patas, e outras não têm nenhuma habilidade.
Fruto do mestrado de Clara, o projeto foi orientado pelo professor Jerome Baron, do Programa de Pós-graduação de Fisiologia e Farmacologia do ICB, em colaboração com Cristián Gutiérrez, pesquisador da Faculdade de Ciências, área de Ciências Biológicas, da Universidade de Alberta, no Canadá. O trabalho está descrito em artigo publicado pela Nature.
Os resultados da pesquisa também revelam uma possível descoberta no campo da filogenética (que estabelece relações entre diferentes grupos de organismos e seu desenvolvimento evolutivo). O estudo indica que as aves que têm algum movimento de preensão com as patas estão dentro do grande grupo de teluraves, que reúne espécies como papagaios, aves de rapina e pica-paus.
“Seus ancestrais eram arborícolas, ou seja, viviam em árvores. Portanto, a capacidade de preensão parece estar muito associada ao estilo de vida arborícola”, afirma Clara Amaral. Ela destaca que, ao longo do estudo, foram analisadas 1.054 espécies, que foram categorizadas em sete níveis diferentes de habilidades com as patas.
Ao todo, foram analisadas mais de 13 mil imagens e vídeos, principalmente dos sites Macaulay Library, o maior arquivo de mídia animal no mundo, e Wiki Aves, que contém apenas espécies brasileiras. As aves mais encontradas nas imagens foram espécies de papagaio, que são consideradas as mais habilidosas. Clara conta que qualquer pessoa pode enviar uma imagem para esses sites. Para isso, basta fazer o registro, identificar a espécie do animal e passar informações adicionais junto com a foto ou vídeo.
Ciência cidadã
Por meio da obtenção de imagens de forma voluntária, o que foi fundamental para a produção da pesquisa, cria-se uma ferramenta científica eficiente, que gera muitos dados com pouco investimento. “A ciência cidadã me inspirou a utilizar essa abordagem para outros tópicos”, afirma Jerome Baron, da Universidade de Alberta. Ele se diz impressionado com o potencial que a colaboração entre cidadãos e pesquisadores profissionais pode alcançar, já que as imagens podem se relacionar a diversas questões, como padrões ecológicos das espécies, propagação de doenças infecciosas, tendências populacionais, monitoramento de alterações na paisagem e mudanças climáticas, por exemplo.
Autores: Cristián Gutiérrez-Ibáñez, Clara Amaral-Peçanha, Andrew N. Iwaniuk, Douglas R. Wylie & Jerome Baron
Publicação: Nature, em 15 de agosto de 2023. Acesso livre.