Tese da UFMG propõe medidas para manejo do esgoto de banheiros químicos

Diagnóstico e sugestões apresentados pela pesquisadora Isabela Lopes, da Escola de Engenharia, são tema do novo episódio do 'Aqui tem ciência'

No Brasil, não há mecanismo regulatório efetivo que normatize o manejo adequado do esgoto gerado por banheiros químicos. A ausência de diretrizes contribui para o descontrole dessa fonte de resíduo líquido, o que pode gerar, em um efeito cumulativo, impactos graves ao meio ambiente e à saúde pública. O diagnóstico é da engenheira ambiental Isabela Lopes, que desenvolveu tese de doutorado no Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG. No trabalho, a pesquisadora sugere aspectos para embasar uma proposta de norma técnica e uma política nacional sobre o tema. 

Segundo a pesquisa, pouco se sabe sobre o destino dos chamados efluentes de banheiros químicos (EBQ), nome técnico do esgoto gerado pelas cabines. Neles, são adicionadas substâncias desodorizantes que inibem a atividade microbiológica a fim de minimizar os odores do material acumulado nesses banheiros. O problema, como observa Isabela Lopes, é que os compostos químicos usados nos desodorizantes tornam o esgoto de banheiro químico nocivo para a saúde humana, podendo provocar várias doenças. Um desses compostos, o formaldeído, pode causar câncer. Isso tem impacto também no destino desse material.

"Quando pensamos em meio ambiente, temos que pensar em bacia hidrográfica. O esgoto que eu lanço aqui está atingindo outro município. O efeito cumulativo é muito grande. E os esgotos de banheiros químicos têm um potencial poluidor muito forte, por causa da presença de matéria orgânica, de uma carga nutricional muito elevadas e de químicos. É um resíduo que precisa de gestão adequada", informa a pesquisadora, em entrevista ao programa Aqui tem ciência, produção da Rádio UFMG Educativa.

Ouça aqui o novo episódio do Aqui tem ciência.

Estações de tratamento

Outro problema indicado pesquisa é que poucas estações de tratamento de esgoto (ETEs) aceitam receber esse tipo de material porque temem que o desodorizante dos banheiros químicos prejudique os microrganismos utilizados no tratamento do esgoto doméstico. "Não há regulação que obrigue as estações a receberem esse material. Portanto, se não são obrigadas, a maioria esmagadora das estações de Minas Gerais não recebe esgoto de banheiro químico", afirma a engenheira.

Na pesquisa, concluída em 2022, Isabela Lopes fez uma caracterização físico-química e microbiológica dos efluentes dos banheiros químicos, analisou experiências internacionais e identificou procedimentos administrativos nos estados de  Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro.

Com base nesse material e em visitas a estações de tratamento de esgoto das 12 macrorregiões de Minas Gerais, a engenheira ambiental propõe, na tese, a criação de uma regulação sanitária dos processos operacionais realizados pelas companhias de saneamento quanto ao recebimento e à disposição final dos efluentes de banheiros químicos. No momento, ela elabora uma proposta a ser apresentada à Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

Segundo Isabela Lopes, as estações de tratamento de esgoto podem, sim, receber os efluentes de banheiros químicos, considerando alguns parâmetros, que ela apresenta na tese de doutorado. "O despejo de um caminhão com 9 a 10m³ de esgoto em cerca de uma hora não impactaria tanto o sistema", exemplifica.

Outro procedimento destinado a impedir que o esgoto de banheiro químico prejudique os microrganismos utilizados no tratamento do esgoto doméstico seria a utilização de tanques-pulmão para guardar o material por 24 horas, antes de despejá-lo para tratamento na estação. "O caráter inibidor de micro-organismos do desodorizante é temporário. Por isso, não há tanto impacto sobre a estação de tratamento", conclui.

Em seu trabalho, Isabela Lopes sugere também que o Brasil adote um modelo parecido com o do Canadá, onde o esgoto de banheiros químicos é destinado a apenas algumas estações de tratamento, aquelas mais bem monitoradas e com melhor funcionamento. A pesquisadora defende, ainda, que esse serviço seja pago, já que o esgoto dos banheiros químicos não é considerado esgoto doméstico, aquele para o qual as estações foram criadas.

Política pública nacional

Desenvolvido no âmbito do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Estações de Tratamento de Esgoto Sustentáveis da UFMG, sob orientação dos professores Cesar Rossas Mota Filho e Thiago de Alencar Neves, ambos do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental, o estudo também propõe a criação de uma normativa que institua uma política pública para resolver a questão no Brasil. Na avaliação de Isabela Lopes, além de normas regulatórias, essa política deve incluir a obrigatoriedade de licenciamento ambiental, em nível municipal, para o transporte do esgoto de banheiros químicos, de modo que o poder público tenha garantia do destino do resíduo.

Outro ponto da proposta é o fortalecimento do Sistema de Manifesto de Transporte de Resíduo (MTR). Criado em 2020, ele registra a origem e o destino de todo o resíduo transportado em um estado. "Hoje, apenas cinco estados têm MTR. É algo que precisa estar instituído em todo o Brasil, já que há resíduos que circulam entre estados. Mas, por conta da pandemia, houve atraso na implementação", informa a pesquisadora. De acordo com a Portaria 280, de 29 de junho de 2020, do Ministério do Meio Ambiente, o prazo para o início da obrigatoriedade da utilização do MTR em todo o Brasil se encerraria em 1º de janeiro de 2021. 

Segundo Isabela Lopes, Minas Gerais já tem o MRT integralmente implementado e hoje é o estado que mais faz uso dele no país. A tese também sugere a criação de um sistema municipal de autorização para eventos que inclua a comprovação, via Sistema MTR, do destino adequado do esgoto de banheiro químico.

Raio-x da pesquisa

Título: Efluentes de banheiros químicos: oportunidades de melhorias regulatórias e gerenciais

O que é: tese que contém diagnóstico e sugestões de medidas para tratamento do esgoto gerado pelos banheiros químicos. Nessas cabines, são adicionadas substâncias desodorizantes que geralmente têm em sua formulação compostos químicos de elevada toxicidade, como o formaldeído, de potencial carcinogênico. Os dados da pesquisa apontam que esses resíduos são majoritariamente lançados no meio ambiente sem qualquer tipo de tratamento, podendo gerar graves danos ambientais e à saúde pública.

Pesquisadora: Isabela Meline Simões Lopes

Programa de Pós-graduação: Meio Ambiente, Saneamento e Recursos Hídricos (PPGSMARH)

Orientador: Cesar Rossas Mota Filho

Coorientador: Thiago de Alencar Neves

Ano da defesa: 2022

Financiamento: Fapemig/ CNPq

Produção

O episódio 146 do Aqui tem ciência tem produção e apresentação de Alicianne Gonçalves e trabalhos técnicos de Cláudio Zazá. O programa é uma pílula radiofônica sobre estudos realizados na UFMG e abrange todas as áreas do conhecimento. A cada semana, a equipe da Rádio UFMG Educativa apresenta os resultados de um trabalho de pesquisa desenvolvido na Universidade.

O Aqui têm ciência vai ao ar na frequência 104,5 FM, às segundas, às 11h, com reprises às quartas, às 14h30, e às sextas, às 20h, e fica disponível também em aplicativos de podcast, como o Spotify.

(Texto de Alicianne Gonçalves)

Assessoria de Imprensa UFMG

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Assessoria de Imprensa UFMG