UFMG sedia INCT que investiga aplicação de tecnologias digitais de comunicação à produção do espaço urbano
Em tempos de urbanização crescente e de expansão da tecnologia informacional, que gera conectividade intensa e ininterrupta, era de se esperar que esses recursos fossem incorporados ao planejamento das cidades, fortalecendo o diálogo entre a população e o poder público. Mas não é bem assim que ocorre. A produção da cidade não corresponde aos anseios de seus habitantes, que têm manifestado de forma inequívoca sua insatisfação com os mecanismos de representação.
É nesse contexto que surge, sediado na UFMG, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) – Tecnopolíticas: Territórios Urbanos e Redes Digitais. O objetivo é formar uma rede de pesquisa de alto impacto científico e social que investigue a aplicação de tecnologias digitais de comunicação aos processos de produção do espaço urbano.
"Nosso interesse é consolidar uma rede ibero-americana com ênfase na América Latina. Mesclamos áreas de conhecimento distintas, como Comunicação e Urbanismo", explica a professora da Escola de Arquitetura da UFMG Natacha Rena, coordenadora do INCT. A subcoordenação é da professora Fernanda Bruno, da UFRJ, que está à frente do MediaLab RJ.
Natacha Rena coordena também o grupo de pesquisa Indisciplinar, que atua na produção de tecnologia social destinada à transformação das cidades envolvendo diferentes atores dos movimentos sociais. O grupo produz cartografias colaborativas on-line relacionadas a processos de disputas territoriais na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Novos projetos como Urbanismo Biopolítico – destinado a subsidiar resistência à financeirização do espaço urbano – têm trazido parceiros, como o Lab Cidade, da USP.
Cultura e território
Pesquisas já desenvolvidas pelo Indisciplinar e por outros grupos serão incorporadas e ampliadas pelo INCT. Muitos dos estudos do núcleo da UFMG lançam mão de mapas georreferenciados gerados de maneira colaborativa. O MapaCulturaBH localiza ações e espaços de cultura e arte; o Em Breve Aqui mostra vazios urbanos. O Media Lab RJ, por sua vez, realiza o Mapping the commons, que cartografa recursos compartilhados nas metrópoles, utilizando plataformas conectadas em rede e alimentadas com informações georreferenciadas e material audiovisual. O Indisciplinar participou das versões da iniciativa para Belo Horizonte e São Paulo.
"Essas cartografias são associadas a páginas Wiki e a outras ferramentas tecnopolíticas que nos auxiliam a produzir bancos de dados colaborativos e a comunicar nossas ações em rede", comenta Natacha Rena, acrescentando que o conhecimento acumulado para as atividades do INCT é gerado também por diversos eventos que, nos últimos anos, reuniram pesquisadores de todo o país.
Além do Indisciplinar, participam do INCT os grupos Praxis e LabGeo, também sediados na Escola de Arquitetura, e outros da PUC Minas, USP e das federais Fluminense, do Rio de Janeiro, de Ouro Preto e do Espírito Santo. O Instituto conta ainda com conexões internacionais – como o IN3, de Barcelona, coordenado por Manuel Castells – e recebe contribuição de pesquisadores da UFMG ligados à Escola de Belas-Artes e à Fafich (Comunicação e Ciência Política).
Plataformas acessíveis
De acordo com a equipe de coordenação do novo INCT, movimentos recentes como o que levou às manifestações de rua em junho de 2013 são sinal claro de que é urgente aliar o que há de mais avançado na investigação em tecnologia da informação à pesquisa urbana multidisciplinar, reunindo arquitetos, urbanistas, geógrafos, economistas, sociólogos, designers e biólogos.
"Pretendemos, com base em nossa produção, auxiliar não apenas as comunidades e os grupos organizados da sociedade civil, mas também o Estado, na constituição de plataformas acessíveis que ofereçam suporte a processos de participação mais eficazes", afirma Ana Isabel de Sá, professora do Instituto Federal de Minas Gerais e pesquisadora do Indisciplinar, uma das principais mentoras do projeto do INCT.
De acordo com Natacha Rena, se, por um lado, iniciativas como o Marco Civil da Internet situam o Brasil na vanguarda das políticas públicas para as redes digitais, constatam-se, por outro, planos de controle das redes, limitação de acesso à informação e à conectividade. "Propostas de tecnologias para cidades inteligentes chegam ao país e trazem inovações para várias dimensões do funcionamento das cidades, mas isso não é transformado em instrumentos participativos, que produzam ampliação democrática efetiva", denuncia.
Ainda segundo a professora, essas propostas frequentemente envolvem maior controle por grupos restritos e a opacidade de mecanismos tecnológicos que passam a articular processos de transformação das cidades. "É preciso formar grupo de investigação de excelência na área das tecnopolíticas e ampliar seu alcance para a esfera do planejamento urbano, envolvendo universidades, Estado e sociedade", conclui Natacha.