Exposição retrata a angústia de quem vive nas zonas de autossalvamento das barragens de mineração
A exposição individual ZAS, da escultora, ceramista e artista plástica mineira Neide Pimenta está aberta à visitação no Centro Cultural UFMG até 22 de setembro. A mostra denuncia a violência da mineração e o movimento de suas barragens por meio de peças em cerâmica, pinturas sobre tecido, videoprojeção e placas de sinalização. A entrada é gratuita e tem classificação etária livre.
O nome dado por Neide Pimenta à exposição diz respeito ao estado de espírito de quem se sente constantemente ameaçado pelo rompimento de uma barragem de mineração. A artista vive há 30 anos em Nova Lima, Minas Gerais, nas proximidades de uma zona de autossalvamento, também conhecida como ZAS. A área está localizada logo abaixo de uma barragem que, em caso de ruptura, pode ser atingida e inundada por rejeitos em minutos.
'Lama invisível'
É nesse contexto de vulnerabilidade, vivenciado pela ameaça da “lama invisível”, termo usado para explicar a incerteza sobre o possível rompimento da barragem, que a artista uniu forças para se expressar. Em suas produções, Neide trabalha com materiais da região para criar peças em cerâmica, manuseando argila e manganês, além de utilizar pigmentos extraídos da própria terra e instrumentos empregados em empresas de mineração para pintar as telas, encontrando traços e texturas por intermédio das peneiras metálicas.
O professor João Guilherme Dayrell, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), descreve as criações de Neide Pimenta: “O contato direto com a terra por meio da interação com a argila atravessa toda sua obra. Agora temos, no entanto, uma série de frotagens, imagens oriundas da fricção com telas de mineradora." Ele enfatiza que “a violência da mineração e o rompimento de suas precárias barragens, que fazem da terra um violento redemoinho sumidouro de plantas, animais e vilarejos inteiros, de um lado, e, de outro, uma abstração inédita se matiza nas imagens que, dispostas numa superfície, alçam voo, desprendendo-se da matéria, instigando a imaginação.”
A dúvida persistente sobre um eventual rompimento reforça sentimentos de insegurança e medo entre aqueles que vivem em uma zona de autossalvamento. Imaginar ter poucos minutos para salvar sua própria vida é uma realidade enfrentada diariamente pela população que vive à sombra de uma estrutura que pode ruir a qualquer instante, ainda mais com o histórico recente de rupturas de barragens no estado mineiro. Esse cenário faz parte do imaginário de ZAS que, sob a ótica da criação e destruição, conduz o público por um devaneio entre expectativa e realidade.
Trajetória
Natural de Governador Valadares, Neide Pimenta é artista plástica, ceramista e escultora, com uma longa carreira no mundo das artes. Estudou cinema, fez teatro e atualmente é pesquisadora no campo da arte contemporânea. Em 1966, iniciou seus estudos na pintura e no desenho com o mestre Aníbal Mattos. Em 2003, começou a frequentar o Atelier do Jambreiro, em Nova Lima (MG), escola de arte fundada por Sara Ávila, ex-diretora da Escola Guignard, onde conheceu a cerâmica, técnica que se especializou sob a orientação de Adel Souki, referência nacional no assunto.
Desde 2005, expõe seus trabalhos em mostras coletivas e individuais, com destaque para Sumidouro, que lhe rendeu o primeiro lugar no Prêmio Artes Visuais de Nova Lima, em 2022. É membro do Grupo de Pesquisa da Cultura do Barro (UFMG), integrante do Grupo de Acompanhamento Espai, com orientação de Nydia Negromonte e Marcelo Drummond, e diretora do atelier de cerâmica O Grão do Barro.