A pandemia pode mudar hábitos de consumo, afirma pesquisador
Em entrevista à Rádio UFMG Educativa, especialista em energias renováveis analisou impactos ambientais das medidas de combate ao novo coronavírus
O esforço para frear a disseminação do novo coronavírus provocou uma desaceleração da atividade econômica global, já que incluiu medidas como restrições ao deslocamento de pessoas e a paralisação de atividades industriais. Esse cenário gerou um fenômeno que vem sendo observado em vários países: a diminuição na quantidade de poluentes presentes na atmosfera. O “efeito colateral” foi registrado em imagens captadas por satélite e divulgadas por organizações como as agências espaciais norte-americana (Nasa) e europeia (ESA).
“A paralisação das atividades está resultando nessa diminuição das emissões de poluentes atmosféricos, mas isso é o que a gente percebe mais claramente. Com certeza temos também uma diminuição muito grande na geração de efluentes líquidos industriais, de resíduos sólidos”, explicou o professor e pesquisador Gilberto Bandeira de Melo, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Escola de Engenharia da UFMG. Ele concedeu entrevista nesta terça-feira (14) ao programa Conexões, da Rádio UFMG Educativa.
“Quando a gente fizer uma avaliação no futuro, vamos verificar nesse período uma redução de todos os impactos ambientais da atividade humana, em áreas urbanas, em atividades industriais, como também nas terras agrícolas”, disse Gilberto, que é membro de um grupo de trabalho da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. O professor ressalta que também houve queda na emissão de gases que, de acordo com cientistas, contribuem para elevar as temperaturas médias do planeta, aquecimento que deve gerar danos irreversíveis à vida nas próximas décadas.
Não precisamos consumir tanto...
O combate ao novo coronavírus está provocando uma crise econômica global, danosa sobretudo à população mais pobre, segundo avaliam economistas. Porém, a pandemia também surge como oportunidade para melhorarmos costumes. “Essa paralisação está mostrando que podemos conviver com o planeta de forma mais sustentável, desde que possamos mudar nossos hábitos de consumo, de comportamento em relação ao meio ambiente”, constatou Gilberto. “Está se demonstrando que a existência ou a subsistência da humanidade não é insustentável. O que era insustentável eram nossos hábitos de consumo, de mobilidade”, avaliou.
Por outro lado, o pesquisador indica o risco de a poluição atmosférica voltar a subir, podendo até ultrapassar os níveis anteriores ao surgimento do novo coronavírus. “É importante ver como nós retomaremos as atividades depois de passada a crise”, alertou. Os países precisam recuperar suas economias sem ignorar a saúde do meio ambiente planetário, explicou o professor.
Os governos podem exigir que as empresas invistam em medidas que evitem o prejuízo ambiental, ressaltou Gilberto. “Vemos que os governos são os únicos capazes hoje de manter a sobrevivência das indústrias. Muitas vão ter que receber incentivos, empréstimos, algum suporte governamental. Isso dá aos governos a oportunidade de, na retomada da atividade econômica, (exigir) que os impactos ambientais sejam controlados de forma mais responsável pelas empresas”, afirmou.
Gilberto enfatizou, no entanto, que não devemos apenas esperar ações estatais. “Todos esses impactos adversos ao meio ambiente vêm de atividade econômicas que existem para satisfazer nossos hábitos de consumo, nossa vontade de adquirir bens”, apontou. “O planeta não tem condição de continuar satisfazendo demandas crescentes. Essa mudança individual é tão ou mais importante que as mudanças nas corporações e nos governos”, acrescentou.