Pesquisa e Inovação

Estudo revela elevada prevalência de ‘cyberbullying’ entre adolescentes brasileiros

Agressões em ambientes virtuais foram mapeadas por pesquisadores da Escola de Enfermagem e do IBGE; mulheres e jovens com saúde mental comprometida estão entre as principais vítimas

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Jovens do sexo feminino, filhos de mães sem escolaridade e estudantes de escola pública estão entre as principais vítimas das agressõesFoto: Pixabay

O cyberbullying, prática de agressões em ambientes virtuais, como redes sociais e aplicativos de mensagem, é um fenômeno contemporâneo cada vez mais frequente, marcado pela divulgação de imagens, vídeos ou mensagens ofensivas sobre um indivíduo ou um grupo. Estudo pioneiro no Brasil sobre essa nova forma de violência, realizado por pesquisadores da Escola de Enfermagem da UFMG e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelou prevalência de 13,2% de jovens vítimas de cyberbullying. O levantamento contemplou amostra de 159.245 estudantes de 13 a 17 anos do ensino fundamental e médio de escolas públicas e privadas.

Os dados constam na edição mais recente da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada pelo IBGE em parceria com o Ministério da Saúde (MS). Jovens do sexo feminino (16,2%), filhos de mães sem escolaridade (16,2%) e estudantes de escola pública (13,5%) estão entre as principais vítimas das agressões. A prevalência também é expressiva entre escolares que relatam sofrer agressão dos pais (22,6%), que não têm supervisão dos pais para o que fazem no tempo livre (18,1%), que não moram com os pais (15,4%), que faltam às aulas sem autorização dos pais (18,4%), que sentem que ninguém se importa com eles (18,6%), que se sentem tristes (17%), que não têm amigos (26,1%) e que afirmam que a vida não vale a pena (22,3%). Além disso, estudantes que usam bebidas alcóolicas (19,1%), cigarro (24,8%), tabaco (22,4%) e drogas ilícitas (26,4%) e que relataram ter tido relação sexual (17,1%) também apresentaram maior prevalência de cyberbullying.

A coordenadora do estudo, professora Deborah Carvalho Malta, do Departamento de Enfermagem Materno-infantil e Saúde Pública da Escola de Enfermagem, explica que os estudantes foram previamente informados sobre os objetivos e as principais características da pesquisa e sobre a participação voluntária: “Eles responderam a um questionário estruturado, autoaplicável por meio de smartphone, sob a supervisão de pesquisadores do IBGE, que contemplava informações sobre situação socioeconômica, contexto familiar, experimentação e uso de cigarro, álcool e outras drogas, violência, segurança, acidentes e outras condições de vida.”

Saúde mental
Ainda de acordo com o estudo, os adolescentes mais novos (13 a 15 anos) tiveram maior prevalência de cyberbullying. A professora ressalta que esse achado é discrepante em relação a alguns estudos internacionais, que têm indicado maior exposição entre os mais velhos. 

A prática também é fortemente associada a indicadores de saúde mental comprometida. Adolescentes que informaram não ter amigos, que acreditam que ninguém se importa com eles e que a vida não vale a pena também sofrem com o cyberbullying. “Esses resultados estão em conformidade com a literatura, que identificou que essas vítimas tiveram um aumento substancial nos riscos relacionados com depressão, ideações suicidas, tentativas de suicídio e automutilação”, reforça Deborah Malta.

A professora afirma que a Organização Mundial de Saúde (OMS) tem manifestado preocupação com o crescimento da prática e de outras formas de violência on-line contra as crianças. “Além do cyberbullying, crescem também a exploração e o abuso sexual infantil on-line, a produção e transmissão de abuso sexual infantil e outras formas de vitimização. A OMS define estratégias para o enfrentamento, como programas de prevenção focada nos jovens, programas de segurança on-line para crianças e adolescentes e medidas regulatórias e de segurança de internet contra cyberbullying”, elenca.

Combate no Brasil
Deborah Malta destaca ainda que, no Brasil, um fato positivo foi a aprovação, em janeiro de 2024, da Lei 14.811/2024, que estabelece que os municípios deverão adotar protocolos de proteção às crianças e adolescentes contra todas as formas de violência no ambiente escolar e viabilizar a capacitação de profissionais docentes. “As medidas deverão ser executadas em parceria com os estados e a União. A lei define punições e multas para adultos que cometem bullying contra crianças ou adolescentes. No caso de agressão cometida por adolescentes, eles respondem por meio de medidas socioeducativas; no caso de crianças, os responsáveis legais são processados, com pena de reclusão de dois a quatro anos e pagamento de multa para situações de intimidação na internet, redes sociais, aplicativos ou jogos", detalha a professora.

O estudo conclui que é necessário monitorar a prática de agressões em ambientes digitais e propor soluções para o seu enfrentamento efetivo, uma vez que mensagens ofensivas podem se disseminar e perpetuar no espaço virtual. “Com a dificuldade de se identificar os agressores na internet, muitas vezes essa forma de violência é ainda mais desafiadora, com poucas punições e permanência oculta da identidade de seus perpetradores. Esses aspectos indicam a necessidade de avançar nas ações regulatórias das redes sociais e estabelecer punições claras, ações nas áreas de saúde, educação, poder judiciário e família, visando cumprir a agenda 2030 relacionada ao bem-estar dos adolescentes”, conclui Deborah Malta.

Com Assessoria de Comunicação da Escola de Enfermagem