Morre Eduardo Cisalpino, reitor da gestão 1974-1978
Criação da Fundep e incentivo à pós-graduação estão entre as marcas do seu Reitorado. Velório será a partir das 11h
Morreu em Belo Horizonte, na noite desta sexta-feira, 22, aos 88 anos, o professor Eduardo Osório Cisalpino, reitor da UFMG entre 1974 e 1978, um dos mais conturbados períodos da história da Universidade.
Reconhecido por buscar estratégias para manter a excelência acadêmica da UFMG diante da reforma universitária imposta pelo regime militar, teve como uma das suas marcas a criação da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep), que foi fundamental para o fomento e o fortalecimento dos programas de pós-graduação.
Em sua gestão, enfrentou também o período da mais intensa perseguição política a servidores e estudantes que se mobilizavam contra a ditadura. O velório será realizado no Memorial Crematório Colina, a partir de 11h deste sábado, 23; o corpo será cremado às 17h.
Nascido em Barbacena (MG), em 1920, graduou-se em Medicina pela então Universidade de Minas Gerais (UMG), em 1957, quando assumiu a função de bacteriologista do Departamento Nacional de Endemias Rurais. Pouco depois retornou à já UFMG, onde se tornou doutor pela Faculdade de Medicina e lecionou na Faculdade de Odontologia e Farmácia e no Instituto de Ciências Biológicas (ICB).
Em 1968, ocupou o cargo de diretor do Conselho de Pesquisa. Foi também coordenador do Centro Regional de Pós-graduação da Região Centro-Oeste e diretor do ICB, do qual recebeu o título de professor emérito.
O nome de Eduardo Cisalpino para assumir a Reitoria da UFMG foi construído entre os integrantes da comunidade universitária em reuniões discretas, numa época em que a campanha aberta era proibida e poderia resultar em prisão.
A submissão foi feita ao então presidente Emílio Garrastazu Médici, num processo lento, relatado pelo próprio Cisalpino em entrevista concedida ao Boletim por ocasião das comemorações dos 80 anos da UFMG. Seu vice foi José Marianno Duarte Lanna Sobrinho, também da Faculdade de Medicina, falecido em 2010.
Como lembra o reitor na gestão 1994-1998, Tomaz Aroldo da Mota Santos, Cisalpino transformou a obrigatoriedade de implantar a reforma universitária em modernização da infraestrutura do campus Pampulha e, para lidar com a tensão entre o dinamismo exigido pela instituição e os constrangimentos administrativos diversos, criou mecanismos administrativo-acadêmicos inovadores.
“Por tudo isso, ele imprimiu na UFMG um modo de ser: autônoma, altiva, moderna, criativa, coletiva, solidária. Eduardo Cisalpino foi e seguirá sendo, em nossa memória, um criador de instituições, um apaixonado da UFMG”, resume.
Na gestão do professor Eduardo Cisalpino, também foi criado o Boletim UFMG, que, em setembro deste ano, chegou à edição 2.000. É uma das publicações jornalísticas mais longevas da universidade brasileira.
Conciliador e inovador
Além de ter que implantar uma reforma universitária arbitrária e buscar alternativas para equacionar escassez de recursos e aumento do número de estudantes (por ordem do governo militar, o número de vagas do curso de Medicina, por exemplo, subiu de 80 para 320, subitamente), Cisalpino conviveu também com a intensa repressão política.
Reitor na gestão 2006-2010, Ronaldo Pena lembrou a nobreza com que Cisalpino enfrentou os tempos da ditadura militar, em especial "sua presença absolutamente emblemática na defesa da Universidade e dos estudantes no caso da invasão do Diretório Acadêmico da Medicina, contribuindo para a história de altivez da UFMG".
A professora Ana Lúcia Gazzola, reitora na gestão 2002-2006, afirmou que Cisalpino sempre foi uma resistência contra a ditadura, em defesa da liberdade e da democracia. "Ao sair da Reitoria, continuou seu trabalho inovador no Instituto de Ciências Biológicas (ICB). Para uma pessoa de sua estatura, nenhum cargo é pequeno: ele sempre iluminou, com sua grandeza, todos os cargos que ocupou." E completou: "Todos o temos como referência e modelo, além da honra de o termos como amigo".
O reitor da UFMG, Jaime Arturo Ramírez, decretou luto oficial de três dias e lembrou que o professor Eduardo Cisalpino foi um acadêmico da mais alta qualidade, conciliador e visionário, que "lançou as bases para uma nova UFMG, cujos fundamentos possibilitam o contínuo desenvolvimento institucional e social da Universidade".
Ainda de acordo com Jaime Ramírez, Eduardo Cisalpino fez da altivez, da integridade e da humanidade as armas da resistência em tempos sombrios. “Armas pacíficas mas não passivas, porque estar à frente de uma Universidade como a UFMG exige do dirigente um firme posicionamento diante das questões do seu tempo. Esse é exatamente o exemplo de dignidade e esperança que nos deixa o professor Cisalpino.”