Obra de autor alemão lançada pela Editora UFMG analisa arte política em Estados autoritários
Uma obra de arte moderna, afirma o crítico e filósofo alemão Boris Groys, é produzida e apresentada ao público como mercadoria ou como ferramenta de propaganda política. Mas a história da arte como mercadoria – ele lembra também – tem recebido muito mais atenção do que a história da arte engajada politicamente. Uma série de artigos de autoria de Groys é motivada "pelo desejo de contribuir para certo equilíbrio de poder no mundo da arte atual, ou seja, para encontrar mais espaço nele para a arte como propaganda política", como escreve o autor na introdução ao livro Arte poder, que reúne parte desses artigos e que a Editora UFMG acaba de lançar na estreia da Coleção Artes Visuais.
Boris Groys discute as relações entre arte e poder sob um viés inovador, ressalta o vice-diretor da Editora UFMG, professor Roberto Said, que colaborou na tradução. "Groys aborda a história recente da arte na Rússia, que ficou de fora dos critérios de avaliação dominantes porque está vinculada à propaganda do regime soviético, ou seja, atende a outras finalidades que não as propriamente artísticas", diz Said.
Groys salienta que a arte (oficial e não oficial) dos antigos Estados socialistas permanece quase totalmente alijada do sistema de museus, o que também ocorre com o que se produziu na Alemanha nazista e na Itália fascista. Ele explica que houve razões para isso: no pós-guerra, sobretudo após a derrocada do socialismo no Leste Europeu, o sistema comercial de produção e distribuição de arte dominou a política. "A arte produzida em condições não mercantilistas era de fato excluída do campo da arte institucionalizada", escreve Boris Groys, que nasceu em 1947, na antiga Berlim Oriental, estudou em Leningrado (hoje São Petersburgo) e foi professor na Universidade de Moscou.
Outra história
A professora Maria Angélica Melendi, da Escola de Belas Artes da UFMG, que escreveu o texto de orelha de Arte poder, exalta em Boris Groys um olhar diferente do encontrado nas teorias tradicionais de origem francesa e inglesa. "Ele traz uma abordagem insólita, que acrescenta muito às nossas reflexões. Conta uma outra história da arte, que foge à narrativa erguida sobre o ponto de vista dos pensadores do Ocidente", afirma a pesquisadora e artista argentina.
Ao analisar o realismo e o construtivismo soviéticos e nomes como Malevich e Rodchenko, Boris Groys – que leciona nas universidades de Nova York e de Karlsruhe, na Alemanha – reconhece o engajamento dos artistas e movimentos, mas desvela muitos outros aspectos. De acordo com Maria Angélica Melendi, trata-se de "um crítico com amplo espectro de interesses, que não trabalha apenas com artes plásticas, mas examina cultura e relações entre as artes, fala de cinema, literatura, seguindo a tradição do Leste europeu".
Ao mesmo tempo que afirma o valor da arte engajada, Groys lembra que a arte que transita no mercado também tem sua dimensão política. "A arte comercial se apresenta como desinteressada, mas é tão política quanto a que tem causa e ideologia facilmente identificadas", diz o professor Said.
Boris Groys defende que a arte motivada por ideologia não é coisa do passado ou de movimentos marginais. "A principal corrente da arte ocidental funciona também, e cada vez mais, como propaganda ideológica. Essa arte é feita e exposta também para a massa", observa o autor de Arte poder. Grandes exposições como as bienais internacionais, segundo ele, tentam "criar e demonstrar um equilíbrio de poder entre tendências artísticas contraditórias, atitudes estéticas e estratégias de representação, para oferecer uma imagem idealizada e selecionada desse equilíbrio".
Livro: Arte poder
De Boris Groys
Editora UFMG
231 páginas / R$ 49 (preço de capa)