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‘Outra estação’ discute: quem quer ser professor no Brasil?

Programa da Rádio UFMG Educativa investiga a realidade dos futuros docentes no país e os principais desafios da área

Vocação é principal razão para a escolha da licenciatura, revelam dados colhidos pelo Enade
Vocação é a principal razão para a escolha da licenciaturaRovena Rosa | Agência Brasil/EBC

Em um cenário nacional de desvalorização da carreira docente, o Brasil corre o risco de sofrer um “apagão” de professores da educação básica no ano de 2040. Segundo estudo recente do Instituto Semesp, faltarão cerca de 235 mil profissionais da área em menos de 20 anos. A questão é discutida no novo episódio do Outra estação, veiculado nesta quinta-feira, 6, na Rádio UFMG Educativa. Estudantes, professores e pesquisadores da área foram entrevistados para responder à pergunta: "Quem quer ser professor no Brasil hoje?".


Perfil e motivações 

O país conta com cerca de 1 milhão de matrículas em licenciaturas, o correspondente a 12% do total de alunos matriculados em cursos de graduação, segundo o último Censo da Educação Superior, de 2020. O último Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), por sua vez, constatou que 76% dos futuros professores do Brasil são do sexo feminino, 72% têm a partir de 25 anos, 70% já trabalham e 52% se declaram pardos ou pretos. “Majoritariamente, as pessoas que se dirigem ao magistério, no Brasil, são aquelas que vislumbram uma possibilidade de melhora de vida”, analisa o professor titular aposentado da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) Romualdo Portela de Oliveira.

No Enade de 2021 também foi realizado um questionário com a seguinte pergunta: "Qual a principal razão para você ter escolhido a licenciatura?". A opção mais respondida, por 35% dos participantes, foi justamente “vocação”, seguida por “profissão importante” (21%) e “professores inspiraram” (15%). “Minha profissão é uma das mais dignas que eu conheço: sou professora, com muito orgulho”, afirma Lily Moraes, que leciona em uma escola municipal em Cedro, no Ceará. Ela diz que desde pequena já brincava com as amigas de ser professora, mas suas maiores motivações foram os mestres e mestras que teve ao longo da vida.

Estudos internacionais indicam outros motivos que tornam a docência atrativa, como a flexibilidade do trabalho, as férias mais longas e frequentes em comparação com as demais profissões, as baixas taxas de desemprego e, por último, o altruísmo. “Se eu fosse professora, estaria ali para formar alunos para o mundo”, imagina Alice Queiroz, aluna do último ano do ensino médio da Escola Estadual Professor Morais, em Belo Horizonte. “Eu quero que eles pensem além, questionem o porquê das coisas. Quero formar seres pensantes!", enfatiza.

Alice Queiroz: formar alunos para o mundo
Alice Queiroz: formar alunos para o mundo Alicianne Gonçalves/UFMG

Desafios da profissão

A professora Sandra Dantas Flontino, vice-coordenadora da escola onde Alice estuda, observa que o interesse dos alunos na carreira docente só diminuiu nos últimos anos. “Eu imagino que é a desvalorização do magistério, a baixa remuneração. Hoje em dia, tem sido cada vez mais difícil trabalhar com jovens e adolescentes”, diz. Segundo ela, tais desafios levam os alunos a pensarem na docência como uma segunda opção.

A profissão conta com um piso salarial desde 2009, hoje fixado em R$ 3.845, mas o valor ainda é baixo, se comparado ao salário de outros profissionais com nível superior, e nem sempre é pago integralmente. Para a professora da Faculdade de Educação da UFMG Lívia Fraga, é urgente que as condições de trabalho melhorem, incluindo salário, plano de carreira, formação continuada, entre outras variáveis. “Isso é algo que torna a profissão estressante, pode gerar problemas de saúde, cansaço e desânimo”, alerta. 

Nathália Cassabone: pessoas pensam que ser professora é fácil
Nathália Cassabone: pessoas pensam que ser professor é fácil Acervo pessoal
“As pessoas pensam que ser professor é muito fácil, principalmente em creche. Muitas pessoas me perguntam o que eu faço na creche. ‘Ah, tu senta e brinca?’, mas não é bem assim. Lógico que a gente senta com as crianças, brinca, dá carinho, um colo, mas não é somente isso. Ser professor é muito mais cansativo do que parece, e professor é pouco valorizado no Brasil. Isso é muito triste, mesmo”, desabafa Nathália Cassabone, estudante de pedagogia em Santa Cruz do Sul, no Rio Grande do Sul.


Caminhos possíveis

Apesar de tantos desafios, quem escolhe a licenciatura tende a permanecer nela. Os dados do questionário do Enade 2021 mostram que 95% dos alunos pretendem seguir na profissão depois de concluir o curso, e 89% se veem trabalhando na área daqui a cinco anos. 

As mudanças para a carreira docente se tornar mais atrativa estão indicadas nos próprios desafios. O professor da USP Romualdo Portela de Oliveira dá o exemplo de países, incluindo o Brasil, que promoviam campanhas para mostrar que os professores são essenciais para o país, há quase uma década. “Temos que agir para melhorar as condições de trabalho dos professores. Com isso, teremos condições de melhorar nossa educação, aumentar a atratividade da profissão docente e garantir qualidade de ensino para toda a população”. Ele conclui que isso depende, também, de políticas públicas.

Para saber mais

Brasil corre o risco de ter um “apagão” de professores da educação básica em 2040

Censo da Educação Superior 2020

Resultados do Enade 2021

Quem quer ser professor? Atratividade, seleção e formação docente no Brasil

Projeto Melhores Cabeças — Fundação Lucia e Pelerson Penido

Anuário Brasileiro da Educação Básica de 2021

Plano Nacional de Educação

Produção

Este episódio do Outra estação é apresentado por Alicianne Gonçalves e Igor Costa, com produção de Alicianne Gonçalves, Luisa Marques e Igor Costa. A edição é de Alessandra Ribeiro, e os trabalhos técnicos são de Cláudio Zazá. Nesta temporada, o programa vai ao ar mensalmente, sempre na primeira quinta-feira. O programa também está disponível nos aplicativos de podcast, como o Spotify.