Pesquisadores do ICB estudam desenvolvimento de uma vacina dupla contra a covid-19
Produzida a partir da bactéria presente na BCG, a substância também deve proteger contra a tuberculose
Uma nova vacina contra a covid-19 está em desenvolvimento na UFMG. A ideia é produzir uma vacina dupla, a partir da popular BCG, que protege contra a tuberculose, para combater também o SARS-CoV-2: o novo coronavírus, que transmite a doença responsável pelas mortes de mais de 500 mil em todo o mundo, em apenas seis meses. A proposta é inovadora: das 140 iniciativas para a produção de uma vacina contra a covid-19 em todo mundo, listadas pela Organização Mundial de Saúde, é a primeira que trabalha com a bactéria da BCG. A pesquisa é realizada no Departamento de Bioquímica e Imunologia do ICB, o Instituto de Ciência Biológicas da UFMG, e envolve também a Universidade Federal de Santa Catarina, o Instituto Butantã, em São Paulo, e Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Doenças Tropicais.
O coordenador do estudo, professor Sérgio Costa, do ICB da UFMG, esclareceu, em entrevista ao programa Conexões, da Rádio UFMG Educativa, o princípio de funcionamento da vacina BCG, e como ela poderia ajudar no combate ao novo coronavírus. “A vacina da BCG é obtida com o atenuamento de uma das bactérias causadoras da tuberculose. Essa bactéria possui um efeito adjuvante em nosso organismo, sendo capaz de ativar o sistema imunológico e potencializar a resposta imunológica para outras patologias”, aponta o professor. “Nosso objetivo é fazer com que essa bactéria possa produzir proteínas importantes do vírus SARS-CoV-2, e assim, imunizar o paciente tanto contra a tuberculose quanto contra a covid-19”, explica Costa.
A capacidade da bactéria presente na vacina BCG potencializar as respostas do sistema imune humano foi o primeiro de vários motivos que levaram os pesquisadores do ICB a trabalharem com a plataforma: “Outra vantagem desse mecanismo é a questão da segurança: é uma vacina utilizada há décadas em diversos países, sem registros de reações adversas. Também nos preocupamos com o baixo custo de produção da substância, e a vacina contra a tuberculose é relativamente barata”, enumera o pesquisador.
A pesquisa está em fase inicial, e sua produção ainda deve atravessar algumas etapas, como explica Sérgio Costa: “No momento, estamos finalizando a fase da construção da bactéria que expressa os antígenos do novo coronavírus. Então, entraremos no estágio de estudos pré-clínicos, para testar se conseguimos realizar a imunização em animais. Só depois, quando se comprovar que a vacina possa ser efetiva, vamos buscar por parceiros privados interessados em investir para escalonar esse processo e assim chegar a testes clínicos com pacientes”, explica.
Costa espera conseguir finalizar os experimentos pré-clínicos ainda este ano, para que em 2021 possa ter início o teste em humanos. “Infelizmente, com baixo nível de financiamento para pesquisas existente no Brasil, o país não tem condições de concorrer com as iniciativas que já vem sendo desenvolvidas no exterior, com aportes financeiros elevados e a participação das indústrias farmacêuticas investindo bilhões de dólares”, lamenta o professor, “mas não é por isso que vamos deixar de desenvolver um mecanismo nacional, que não dependa da transferência de tecnologia de outros países”, defende. “A UFMG é uma instituição de referência na área, mas apesar de termos as ideias e a tecnologia para fazer acontecer, a falta de investimento financeiro prejudica muito a velocidade com que nós conseguimos entregar resultados para a população, em casos como este”, afirma o pesquisador.
Outras vacinas em teste no ICB
Além da pesquisa coordenada pelo professor Sérgio Costa, outras iniciativas que envolvem a produção de uma vacina contra o vírus SARS-CoV-2 estão em curso no Instituto de Ciências Biológicas, da Universidade. Uma delas é coordenada pelo professor Ricardo Gazzinelli, que utiliza o vírus Influenza atenuado como plataforma para introduzir antígenos do novo coronavírus.
O ICB também vai participar de testes clínicos da vacina contra o novo coronavírus desenvolvida pela empresa biofarmacêutica chinesa Sinovac Biotech. Os testes serão feitos em colaboração com o Instituto Butantan, de São Paulo, e envolvem, ao todo, doze centros de pesquisas brasileiros. A previsão é que os trabalhos comecem ainda no mês de julho, após autorização da Anvisa, Agência Nacional de Vigilância Sanitária e da Comissão Nacional de Ética. Os testes devem envolver a participação de nove mil voluntários brasileiros dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná, além da cidade de Brasília.
O programa Conexões desta sexta-feira falou com o professor Sérgio Costa, do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, sobre o desenvolvimento da nova vacina a partir da bactéria presente na BCG.