Semana do Servidor discute trabalho remoto pós-pandemia
Regulamentação, impactos, contradições e desafios foram analisados por gestores do governo federal e da UFMG
O regime de teletrabalho teve sua regulamentação acelerada, no âmbito do governo federal, devido à pandemia do novo coronavírus, com a publicação da Instrução Normativa nº 65 (IN 65), de 30 de julho de 2020. O instrumento estabelece os procedimentos gerais que devem ser observados pelo funcionalismo público federal em relação à adesão ao Programa de Gestão, que prevê, fundamentalmente, o cumprimento da jornada de trabalho fora das dependências físicas do órgão.
Suas implicações foram discutidas, durante a manhã desta sexta-feira, dia 30, no webinar Trabalho remoto e futuro do trabalho remoto pós-pandemia na UFMG: impactos, contradições e desafios, que reuniu professores, sindicalistas e representantes de órgãos governamentais. A atividade, mediada pela coordenadora geral do Sindicato dos Trabalhadores nas Instituições Federais de Ensino (Sindifes), Cristina Del Papa, marcou o encerramento das principais discussões programadas para a Semana do Servidor e está disponível no canal da Coordenadoria de Assuntos Comunitários (CAC) no YouTube.
Os pormenores da IN 65 foram descritos pela diretora de Provimentos e Movimentação de Pessoal do Ministério da Economia, Luiza Lemos Roland. Segundo ela, a medida, que prevê a adoção de um regime híbrido entre o presencial e o de teletrabalho, abrange servidores, empregados públicos e profissionais com contratos temporários – e exclui estagiários e trabalhadores terceirizados.
“As atividades compatíveis com o teletrabalho, integral ou parcialmente, são aquelas que não exigem muita interação entre as pessoas e que sejam caracterizadas por necessidade de concentração, previsibilidade e padronização”, distinguiu.
De acordo com a representante do Ministério, cada unidade deverá formular suas regras gerais e sua tabela de atividades, que caracterizará a jornada de trabalho, definirá o percentual de trabalhadores participantes e projetará o ganho de produtividade decorrente do novo regime. O acompanhamento do programa demandará um sistema informatizado.
Luiza Roland informou ainda que é vedado o acúmulo de horas extras, bem como a concessão de auxílio-moradia, adicional noturno, ajuda de custo para mudança e adicionais de insalubridade aos servidores em regime de teletrabalho.
Benefício mútuo
O auditor federal Breno Barbosa relatou a experiência da regional mineira da Controladoria Geral da União (CGU-R/MG). Ao longo dos últimos sete anos, o órgão tem-se adaptado ao processo chamado de “gestão de demandas”, como caracterização de seu regime de trabalho.
“Esse percurso é muito válido, para que algumas coisas sejam desmitificadas, e outras reveladas, visando à melhoria do serviço público”, disse. De acordo com Breno Barbosa, a baixa adesão foi um dos entraves enfrentados no início do processo. “Mas foram feitos estudos, debates internos e atualizações. Hoje, o regime está consolidado e atinge 89% dos servidores. O foco na qualidade do serviço tomou o lugar das metas quantitativas, e hoje prevalece o reforço contínuo da visão de benefício mútuo”, testemunhou.
A professora Mírian Dantas falou em nome do Fórum Nacional de Pró-reitores de Gestão de Pessoas (Forgepe) sobre as expectativas em relação ao estabelecimento do trabalho remoto nas universidades. Segundo ela, o tema já vinha sendo discutido no interior das instituições, mas não compunha uma agenda de prioridades.
“A pandemia nos fez mudar a chave rapidamente, do presencial para o remoto. Fizemos a transição sem planejamento”, observou. Para a professora, as políticas da IN 65 devem ser alinhadas com as características próprias das universidades, mediante "um modelo de controle em múltiplas camadas, acompanhado da evolução dos sistemas, para que a normatização garanta direitos, qualidade de vida e segurança aos trabalhadores”.
Protagonismo do trabalhador
Também participou da discussão o professor aposentado da Faculdade de Direito da UFMG Márcio Túlio Viana. Ele lembrou que, em um passado recente, os trabalhadores eram mais confiantes e seguros. Por isso, aceitavam, mais facilmente, as disciplinas e hierarquias. Isso, em seu entendimento, potencializava a luta coletiva no interior dos sindicatos. “Hoje temos mais riscos e menos sonhos, e somos resistentes em aceitar os comandos dos líderes sindicais. Por um lado, isso é positivo, mas é preciso que o sindicato saiba lidar com essa nova realidade de dissonâncias”, refletiu ele sobre a atuação dos trabalhadores no cenário de transição que se anuncia.
O professor Sebastião de Pádua representou o Sindicato dos Professores de Universidades Federais de Belo Horizonte, Montes Claros e Ouro Branco (Abubh). Ele foi enfático ao afirmar que “casa não é lugar de trabalho”, ao comentar, mais especificamente, o regime de ensino remoto emergencial, adotado recentemente pela UFMG. “A conjugação do ambiente laboral com o doméstico gera excesso de trabalho. Depois de superada a pandemia, devemos retomar o contato pessoal, regressar aos nossos laboratórios e a outros ambientes de pesquisa, formação e debates”, defendeu.
No mesmo sentido, o servidor federal Marcelo Rosa, que representou a Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra), chamou a atenção para o fato de que o Programa de Gestão "representa o investimento em atividades individuais, retira a ênfase no trabalho como processo e promove a avaliação baseada apenas nas metas quantitativas”. Para ele, a regulamentação do teletrabalho é um instrumento de antecipação da reforma administrativa. "Ao aderir à IN 65, a instituição renuncia à autonomia administrativa. Além disso, o regime remoto causa isolamento e invisibilidade no trabalho e pode trazer problemas físicos e emocionais”, acrescentou.
A Semana do Servidor será encerrada neste sábado, dia 31, com uma oficina de jogos ministrada pelo professor Luciano Pereira, da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional. A atividade começa às 9h.